Você sabe como nomear esta rocha ígnea vulcânica?
Você sabe como nomear esta rocha ígnea vulcânica? Fonte: Pixabay.com

A CLASSIFICAÇÃO DE ROCHAS ÍGNEAS “DE STRECKEISEN” (QAPF)         

Dar nomes as rochas é uma tarefa simples, porém para estudantes de geologia em início de curso, estudantes e profissionais de áreas relacionadas a geologia e para leigos pode parecer uma tarefa extremamente complexa. De fato, se você não possuir um “norte”, isto se torna uma tarefa muito complexa. Foi isto que muitos geólogos até meados do século passado enfrentaram. Não se existia um sistema definitivo para se nomear rochas, até que a IUGS (International Union of Geological Sciences/ União Internacional de Ciências Geológicas) resolveu criar comissões para se resolver diversas questões da época. Entre uma dessas questões estava a nomenclatura de rochas ígneas, já que existiam diversas diferentes formas de se nomear uma mesma rocha, existindo no ano de 1920 cerca de 1500 nomes diferentes para rochas e diferentes sistemas de classificação utilizados. Deste ponto em diante da história da geologia que surge a grande importância de Streckeisen e o sistema de classificação de rochas ígneas que ele ajudou a desenvolver.

Existem basicamente três tipos de rochas, que são as rochas ígneas, as sedimentares e as metamórficas. Durante este artigo nós somente elucidaremos a classificação de rochas ígneas.

           

QUEM FOI STRECKEISEN?

 Albert Streckeisen (Figura 1) nasceu em 8 de novembro de 1901, na cidade de Basel, na Suíça, vindo de uma velha e tradicional família de sua cidade, filho do Dr. Albert Streckeisen, que foi professor de medicina na Universidade de Basel.

Albert Streckeisen
Figura 1: Albert Streckeisen em Veneza no ano de 1979. Fonte: Le Maitre (2002).

Streckeisen estudou geologia, mineralogia e petrologia nas universidades de Basel, Zurique e Berne, defendendo a sua tese de doutorado em 1927 sob orientação do famoso professor Reinhard. No mesmo ano, aos 26 anos, assumiu o cargo de professor de mineralogia e petrologia na Universidade Politécnica de Bucareste, na Romênia. Também se tornou membro do Serviço Geológico da Rômenia, sendo muito ativo nos trabalhos de mapeamento geológico.  Durante esta época, seu interesse em classificação petrográfica de rochas ígneas possivelmente iniciou.

Na década de 30 retornou a Suíça (para ficar na Romênia ele teria que se naturalizar romeno) para ensinar geologia e ciências naturais a nível de colegial em Berne, permanecendo até 1939. Após isto juntou-se como professor associado na Universidade de Berne em 1942, tendo grande importância como professor de geociências na cidade, recebendo o título de professor honorário nesta instituição.

Visto a grande dificuldade em diversas questões das geociências até meados do século passado, a IUGS (International Union of Geological Sciences/ União Internacional de Ciências Geológicas) resolveu criar comissões para as diferentes áreas das geociências para tentar elucidar várias dúvidas. Albert foi convidado pela IUGS a liderar a Comissão em Sistemática de Rochas Magmáticas (que se tornou depois Subcomissão em Sistemática de Rochas Ígneas da IUGS) e formular junto com vários outros petrólogos os termos de classificação de rochas ígneas. Começou a trabalhar neste projeto com mais de 60 anos de idade, permanecendo por cerca de 35 anos trabalhando firmemente neste sistema de classificação. Talvez por ser o líder do grupo, o sistema de classificação QAPF é chamado de sistema classificação de Streckeisen, diagrama de Streckeisen, entre outros nomes.

Com o avanço da geoquímica e seu uso na petrologia, a comissão liderada por Streckeisen também ajudou a criar sistemas de classificação química de rochas vulcânicas, como o diagrama TAS (total alkalis vs silica).

Pelo seu amplo trabalho recebeu da Sociedade Mineralógica Alemã a medalha Abraham-Gottlob-Werner em 1984.

Faleceu em Berne, em outubro de 1998 aos 97 anos, durante o período em que ele estava começando a revisão da segunda edição do sistema de classificação junto a IUGS.

 

O SISTEMA DE NOMENCLATURA DE STRECKEISEN

Como citado no texto, o sistema de classificação de rochas ígneas de Streckeisen foi desenvolvido por Albert Streckeisen e outros geólogos da Comissão em Sistemática de Rochas Magmáticas (que se tornou depois Subcomissão em Sistemática de Rochas Ígneas da IUGS), que foi formada a pedido da USGS, visto que não existia uma uniformidade entre vários conceitos das Geociências, como a simples tarefa de dar nome a rochas ígneas.

 Uma nota importante que deixamos aqui é que o sistema de classificação foi desenvolvido pela Subcomissão em Sistemática de Rochas Ígneas da USGS, que foi liderada por Streckeisen, tendo diversos petrólogos atuando em conjunto. Por isso recebe quase sempre o nome genérico de classificação de Streckeisen. Durante o texto nós chamaremos de sistema de classificação de Streckeisen.

 O sistema de nomenclatura de Streckeisen para rochas ígneas é simples, amplo e autoexplicativo (depois que você o entende). Antes de utilizar os diagramas de classificação de Streckeisen você deve classificar a rocha entre plutônica e vulcânica baseada em seus parâmetros texturais, estruturais e mineralógicos. Depois disso, você deve se atentar se a rocha possui mais de 90% (em composição) de minerais máficos (os minerais máficos são os minerais ferromagnesianos presentes na rocha, entre eles estão olivina, piroxênio, anfibólio, micas, entre outros), opacos (minerais em que a luz não atravessa, se tornando escuros no microscópio ótico petrográfico) e acessórios (como epidoto, zircão, titanita, carbonatos, allanitas, entre outros). Este grupo é chamado genericamente M’. Para rochas que possuem mais de 90% de minerais M’ a classificação exige maior cuidado, pois existem classificações e diagramas específicos para cada mineralogia, sendo a parte mais complexa deste sistema de classificação. Estes diagramas mais específicos são usados para dar nomes a rochas peridotíticas, piroxeníticas, lamproíticas, entre outras. Estes outros diagramas não serão expostos aqui e serão foco de outros posts. Note que este sistema de classificação descarta os minerais secundários (minerais de alteração).

Quando a rocha possui quantidade de minerais M’ menor que 90%, é utilizado os chamados diagramas QAPF. Estas letras nada mais são que as letras dos minerais que compõem os vértices do diagrama.

Q: Soma dos polimorfos de sílica, incluindo as variedades de quartzo de baixa e alta temperatura, como tridimita, crisobalita e coesita. A letra Q vem de quartzo.

A: Reúne os feldspatos alcalinos, como ortoclásio, microclina, pertita, anortoclásio, sanidina, adularita e albita. A letra A vem de Álcalis feldspatos.

P: Reúne os plagioclásios com composição de anortita entre 5 e 100% e escapolita. A letra P vem de plagioclásio.

F: É a soma dos feldspatóides presentes, como leucita, pseudoleucita, nefelina, sodalia, noseana, entre outros.

O diagrama QAPF respeita vários princípios básicos da petrologia ígnea, como a não ocorrência de quartzo e feldspatóides juntos (note que o QAPF forma dois triângulos, o superior QAP e o inferior FAP), classificações referentes aos minerais acessórios (note as pequenas divisões próximo a linha AP), entre outros. Como dito o diagrama é autoexplicativo e se observado e estudado com cautela é possível se tirar muitas conclusões.

Existem dois diagramas QAPF básicos, um para rochas ígneas plutônicas e outro para rochas ígneas vulcânicas, que são divididos em diagramas genéricos (usados principalmente para a classificação macroscópica, são menos utilizados se comparado aos outros) e os mais detalhados (usados principalmente na classificação microscópica) (Figura 2 e 3). Não vamos falar detalhadamente de cada um, pois o texto se tornaria muito extenso, ao fim do artigo, deixaremos uma lista de referências para um maior aprofundamento no assunto.

Diagrama QAPF para rochas ígneas plutônicas
Figura 2: Diagrama QAPF para rochas ígneas plutônicas. Adaptado de: rc.unesp.br
Diagrama QAPF para rochas ígneas vulcânicas
Figura 3: Diagrama QAPF para rochas ígneas vulcânicas. Fonte: rc.unesp.br

COMO UTILIZAR CORRETAMENTE ESTES DIAGRAMAS

A exata forma de utilizar os diagramas sem dúvida alguma é uma grande dúvida para muitas pessoas. Nestes diagramas você só considera a existência dos elementos que fazem parte do diagrama, que são quartzo e derivados, plagioclásios, álcalis feldspatos e feldspatóides. Os outros minerais devem ser desconsiderados. Com a somatória dos minerais considerados no diagrama, existe a necessidade de um recálculo para 100 % (Figura 4). Observe a sistemática da imagem abaixo. Vamos considerar uma rocha de 20% de quartzo, 25% de plagioclásio e 20% de álcalis feldspatos.

Recálculo para 100% dos elementos constituintes desta rocha para plotagem no diagrama QAPF.
Figura 4: Recálculo para 100% dos elementos constituintes desta rocha para plotagem no diagrama QAPF.

Após o recálculo deve-se plotar no diagrama as retas referentes a cada porcentagem dos minerais seguindo a sistemática das figuras abaixo (Figura 5). As linhas paralelas aos eixos representam a porcentagem destes minerais (na parte superior da figura 5 é mostrada uma linha perpendicular aos eixos que mostram a diminuição da quantidade dos minerais que a reta representa). Note que os vértices dos elementos equivalem a 100 %, e quanto mais longe dos vértices, menores os valores de cada elemento. A quantidade do elemento deve ser plotada paralela ao seu respectivo eixo, quanto mais próximo do vértice, maior o valor deste elemento.

Diarama QAP
Figura 5: Na parte superior, o diagrama mostrando as variações das porcentagens em cada eixo, na parte inferior, um diagrama mostrando a plotagem paralela ao eixo para os valores máximos, mínimos e propostos para cada elemento.

Após isto é só verificar onde as três linhas se interceptam e conferir qual o nome da rocha do respectivo campo. No exemplo dado, a rocha com esta composição segundo o diagrama QAPF pode ser classificada como um monzogranito. Se as linhas não se interceptarem, existe algo de errado em algum passo, visto que sempre as linhas se interceptam.

Um melhor entendimento do diagrama se exige prática, logo se você não entender “de primeira” fique calmo, releia o texto, busque novas fontes de leitura e utilize diferentes valores dos elementos para praticar que em breve ficará claro para você.

 

MUITO MAIS QUE UM SIMPLES DIAGRAMA

 O sistema de classificação de Streckeisen é uma ferramenta fundamental para petrologia, visto que é um sistema de classificação que ao mesmo tempo que é simples, é bem amplo e completo. Diversas conclusões podem ser retiradas sobre o estudo detalhado destes diagramas.

Abordamos aqui as classificações para rochas ígneas plutônicas e vulcânicas com M’< 90 %. Para rochas ígneas plutônicas e vulcânicas com M>90% e rochas vulcanoclásticas se utilizam outros diagramas (falaremos em outros posts sobre eles).

Se você chegou aqui, espero que tenha entendido para que serve e como se utiliza este sistema de classificação. Caso não tenha entendido, fique calmo e releia o texto e busque novas fontes para melhor compreensão deste sistema.

Deixaremos nas referências alguns dos materiais utilizados para a preparação deste post, caso não tenha entendido, busque uma das nossas fontes recomendadas ou algum livro de petrologia ígnea.

 

REFERÊNCIAS

 Le Maitre, R.W. (Edit.). Igneous Rock: A Classification And Glossary Terms. New York: Cambridge University Press, 2002, 236 p.

Gill, R. Rochas e Processos Ígneos: Um Guia Prático. Tradução de Félix José Félix José Nonnenmacher. Porto Alegre: Bookman, 2014,502 p.

 Szabó, G.A.J.; Babinski, M.; Teixeira, W. Rocha Ígneas. In: Teixeira, W.; Toledo, M. C. M.; Fairchild, T. R.; Taioli, F; (eds.). Decifrando a Terra. São Paulo: Oficina de Textos, 2000.  p. 327-346.

Wernick, E. Rochas magmáticas: Conceitos fundamentais e classificação modal, química, termodinâmica e tectônica. São Paulo: Editora Unesp, 2004. 656 p.

Streckeisen, A. To each plutonic rock its proper name. Earth Science Reviews. International Magazine for Geo-Scientists, v. 12, p. 1-33, 1976.

Disponível em: http://www.rc.unesp.br/museudpm/rochas/magmaticos/qapf.html. Acesso em: 3 de janeiro de 2019.

Disponível em: https://pixabay.com/pt/rocha-%C3%ADgnea-rocha-rocha-vulc%C3%A2nica-909319. Acesso em: 3 de janeiro de 2019.